FERNANDO FABBRINI
O show de Osho
Redação O Tempo
Era uma vez um jovem professor de filosofia dotado de olhar penetrante e de um excepcional talento para o marketing. Esperto, oportunista e conhecedor profundo da alma humana, o homem saiu da pequena cidade de Pune, na Índia, e criou um império de bilhões de dólares em pouco mais de uma década. Assim poderia ser resumida a trajetória de Rajneesh Chandra Mohan Jain (mais tarde autodenominado Osho), sobre o qual a Netflix produziu um documentário de primeiríssima qualidade intitulado “Wild Wild Country”.
As comunidades rajneesh se espalharam pelo mundo nos anos 80. Milhares de jovens, adultos e casais com filhos abandonaram seus lares e seguiram fanaticamente o guru sob a promessa de prazer, liberdade e “iluminação”. Mais que isso: com vultosas contribuições financeiras, ajudaram a erigir uma instituição isenta de impostos que incluía uma rede imensa de editoras, centros de meditação, restaurantes, supermercados, lojas de souvenires, butiques, grifes e até um banco exclusivo para os acólitos. Tudo devidamente ilustrado com a cara do guru, logomarca onipresente.
Com a expansão galopante dos negócios, Osho e sua controvertida executiva principal, Ma Anand Sheela, compraram uma área no Estado norte-americano do Oregon para ali fundarem uma cidade. Foi então que os problemas surgiram. As pequenas comunidades vizinhas daquele Estado rural estranharam a presença crescente dos rajneeshs em suas roupas de cor laranja ou vermelha, sempre felizes, sorrindo e cantando e – pior –
praticantes do que se chamava, na época, de amor livre.
Para os rednecks – os moradores do interior – a seita era coisa do capeta, antiamericana, inimiga dos valores tradicionais e invasiva. E eles tinham certa razão: as faces sorridentes dos recém-chegados escondiam uma postura arrogante e belicosa, típica daqueles que se acham especiais e detentores de uma consciência superior. Muitos seguidores de Osho andavam armados. Jornais e emissoras de TV botaram fogo no assunto, pautando notícias diárias sobre o tal conflito de ideias e de comportamentos.
Em 1984 começou uma briga judicial que logo ultrapassou fronteiras e penetrou no território do confronto pessoal. Por meio do voto habilmente cooptado, a seita tomou posse legalmente da cidade de Antelope, mudando seu nome para Rajneeshpuram. Montaram uma nova prefeitura – de cor laranja –, um corpo policial uniformizado em tons púrpura (meio ridículo, convenhamos) e até uma milícia bem-armada com pistolas e fuzis automáticos. Indignados, os rednecks também foram às trincheiras. Uma bomba explodiu no hotel Rajneesh em Portland. No contra-ataque, seguidores de Osho infectaram com salmonela as saladas de dez restaurantes de Antelope, contaminando centenas de moradores – o primeiro caso de terrorismo químico ou biológico dos EUA. Tinha virado guerra.
Enquanto o pau quebrava nos embates das cortes e escaramuças do lado de fora, o guru repousava numa gigantesca mansão construída para ele. Tratado como uma divindade, dispunha do conforto de um marajá, roupas finíssimas, caviar iraniano, lindas mulheres apaixonadas e nada menos que 17 automóveis Rolls-Royce, além de aviões e helicópteros. No pulso, exibia um Rolex cravejado de diamantes.
Fonte:https://www.otempo.com.br/opiniao/fernando-fabbrini/o-show-de-osho-1.1996260
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