O LADO B DE OSHO


Sannyasins acompanham passeio  de carro de Osho em Rajneeshpuram

Discípulos acompanham passeio de carro de Osho em Rajneeshpuram © 2003 Samvado Gunnar Kossatz (imm046.jpg) / ver na Wikipedia


O lado B de Osho

A expressão “lado B” nasceu nos tempos do disco de vinil. Neles, o lado A continha as músicas mais comerciais, que faziam sucesso, que as pessoas conheciam e esperavam encontrar no álbum, ao passo que no lado B estavam as canções desconhecidas, experimentais, alternativas ou sem apelo comercial (que muitas vezes depois de conhecidas eram as que mais gostávamos).

O termo lado B é também empregado a artistas que estão fora do conhecimento do grande público, os undergrounds.

O lado B de uma pessoa é aquele menos conhecido ou popular. Sobretudo quando se tratam de aspectos negativos da personalidade, que a pessoa reprime ou não reconhece, podemos chamá-lo, em termos junguianos, de “sombra”.

Wild Wild Country


 

Na série documental da Netflix Wild Wild Country, começamos a perceber uma faceta de Osho que desconhecíamos.

Ela conta um pouco da história em torno da construção e estabelecimento de uma comuna de Osho, denominada Rajneeshpuram, no condado de Wasco, Oregon (EUA), e dos conflitos (também ideológicos e culturais) que se travaram com a população do centro do condado, próximo a Rajneeshpuram.

Ma Anand Sheela era quem administrava a comuna, o que incluía a chefia da força de trabalho dos discípulos ou sannyasins (renunciantes) de Osho. Em meio à tensão com a comunidade local, ela coordenou um ataque que infectou “com salmonela os buffets de salada de pelo menos dez restaurantes na sede do condado de Wasco, em uma tentativa de incapacitar a população votante da cidade para que seus próprios candidatos vencessem as eleições de 1984 no condado de Wasco. Embora 751 pessoas, incluindo vários funcionários públicos do condado de Wasco, tenham sido infectadas e 45 pessoas tenham sido hospitalizadas, não houve vítimas fatais.” (Wikipedia)

O final do documentário mostra Osho colocando toda a culpa em Sheela, classificando-a como perigosa, e se isentando de toda responsabilidade. Pelo ataque, Sheela foi condenada sozinha a quatro anos e meio de prisão, dos quais cumpriu 29 meses antes de ser solta por bom comportamento. Ela, que por toda vida teve amor e admiração pelo mestre, provavelmente não quis incriminá-lo perante as autoridades.

Para a reportagem da BBC, o alemão radicado no Brasil Mukto, relatou atentados e ameaças que os cidadãos de Wasco também infligiam aos membros da comunidade, que também foram relatados por Anthony Thompson.

Osho acusou o governo americano de, no processo de sua extradição, fazer um itinerário de viagem muito mais longo e cansativo que o necessário, com diversas viagens de avião e paradas, em um período em que, conclui ele, teriam-no envenenado lentamente, o que teria debilitado sua saúde e possivelmente contribuído para a morte de seu corpo físico (ou para a desistência de Osho dele), cinco anos mais tarde. Os Estados Unidos também realizou uma perseguição diplomática ao guru, fazendo com que todos os países em que Osho buscasse estabelecer-se o extraditassem. O local em que ele conseguiu passar mais tempo, antes de sua volta definitiva à Índia, foi o Uruguai, na cidade de Punta del Este.

O lado B de Osho

Agora o ponto crítico para Osho. Sheela estava em contato constante com ele, e é difícil imaginar que o mestre não soubesse de coisas muito flagrantes da comunidade.

O britânico Hugh Milne, ex-discípulo e alegadamente ex-guarda-costas de Osho, não tem a menor dúvida de que ele sabia o que Sheela estava fazendo, conforme afirma em outra reportagem da BBC. Anthony Thompson ressalva que Milne era, na verdade, guarda-costas de Laxmi, a secretária de Osho na época, e que ele guardava apenas as sessões de darshan – aparecimento ou palestra – do mestre. Pelo livro de Milne descrever basicamente problemas relacionados a Sheela e não a Osho, Thompson afirmou que ele deveria se chamar “A secretária que falhou”.

Não se pode afirmar o quanto Osho sabia das atividades de Sheela, mas podemos concluir que ele não sabia de tudo que ela fazia, visto que uma de suas peripécias foi instalar um grampo de escuta telefônica na linha do próprio Rajneesh.

Embora, em outra oportunidade e época, em Poona (Índia), Osho tenha afirmado que sabia tudo o que acontecia na comunidade de então, isso não se aplica necessariamente à comunidade do Oregon. Devido à coincidência com seu período de silêncio autoimposto, e também com um maior isolamento, provavelmente ele tinha de fato menos conhecimento dos assuntos do rancho.

E o que aconteceu? Além do caso de envenenamento, Milne relata à BBC que os discípulos, sob o comando de Sheela, “trabalhavam de 60 a 100 horas por semana” para construir a comuna, o que os estava destruindo de cansaço. O “pior” estava no tratamento dado aos que procuravam o centro de saúde, para o qual as instruções de Sheela eram: “dê a eles uma injeção e mande-os de volta para o trabalho”.

As condições de trabalho que se deram nesta comuna, em vista a construir uma cidade inteira em pouco tempo, nem sempre foram regra nos ashrams de Osho. Ao que tudo indica, foram uma exceção. O que relatamos aqui, passados por 2 ou 3 anos, são uma parte da vida de Osho e não representa o ambiente dos ensinamentos transcritos na grande maioria de seus livros, devido ao fato do mestre ter estado em silêncio autoimposto nos tempos de Oregon.

Podemos ver que o foco de Sheela na construção da comuna se tornou obsessivo, o que contraria completamente os ensinamentos do próprio Osho, focado na consciência humana. É difícil imaginar que nada disso chegasse a Osho ou que ele, mesmo sem poderes paranormais, não percebesse o cansaço ou apatia estampado no rosto de seus seguidores, ou que haviam determinadas pessoas em trabalhos de construção civil digamos, às 8h da manhã e também às 9h da noite.

Talvez a lição mais importante de tudo isso seja que, não importa quão carismático, inteligente ou mesmo iluminado seja um mestre ou líder, jamais perca seu senso crítico e capacidade de examinar sua situação existencial.

A polêmica de Christopher Calder e a resposta de Anthony Thompson

Christopher Calder, ex-discípulo de Osho, publicou um texto polêmico, tendencioso e um tanto rancoroso intitulado Osho, Bhagwan Rajneesh e a verdade perdida, em que usa trechos de seus discursos (que se tornaram livros), fora de contexto, e relatos de segunda mão, afirmando que Rajneesh criava uma espécie de seita ou culto em torno de sua figura. Mas talvez a característica principal desse texto de Calder seja sua má vontade com relação a Osho, que o levou a deturpar e mal interpretar diversas práticas e ditos seus, além de não listar também os ensinamentos válidos do mestre e sua mensagem de consciência e autoconhecimento, que são o ponto quando se trata de Osho.

Calder recebeu uma resposta do Ph. D. Anthony Thompson, que traduzimos e publicamos em Resposta às críticas de Christopher Calder a Osho, por Anthony Thompson.

Aonde tudo isso encaixa no perfil de um iluminado?

O ser humano é uma dicotomia. Somos a consciência transcendente e pura, intocável pelo material, e somos a manifestação física dessa mesma consciência, ou consciências individuais, egos, pessoas.

O fato de uma pessoa ter chegado ao nível de testemunhalidade consciente, de entender muito dos processos da mente humana e da evolução da consciência à mente, não faz dela automaticamente santa ou modelo de comportamento. A própria “pessoa”, em última instância, é ilusória.

A consciência, em si, não é moral nem imoral, é amoral, está além da moralidade, ainda que se possa argumentar que dentro do sentido de integralidade cósmica do ser é impossível se querer prejudicar a si mesmo. Isso tudo em termos de consciência; pois na relação com o mundo a mente sempre tem de atuar e por vezes se revelar moral, outras imoral.

Em matéria de consciência, somos todos divinos. Em matéria de mente, somos todos falíveis.

Não há, na verdade, ninguém de quem podemos falar que todas as ações sempre trouxeram resultados positivos, ou negativos.

Entender o aspecto de ações negativas de Osho, ou de qualquer pessoa, é entender também sobre si mesmo. Você pode estar caminhando para um alto grau de consciência e, ainda assim, ter atitudes que não são muito corretas com seus semelhantes, ou conceder-se instantes de inconsciência.

Enquanto estivermos aqui, a mente continuará operando e nós, através dela, estaremos sujeitos a fazer bobagens, mesmo que não tenhamos mais um ego estruturado. Através de nossa mente, continuaremos tendo de responder, melhor ou pior, aos desafios do viver e do relacionar-se.

Sobre Osho, podemos dizer que foi provavelmente a pessoa que deu melhor expressão a inúmeras questões espirituais e mentais, um dos que melhor vasão deu às inspirações do espírito, que mais percebeu coisas, teve insights, reflexões, e mesmo replicou os insights válidos de outros. Sua contribuição para a libertação do ser humano de determinados padrões religiosos, sexuais e da própria mente é inestimável, por isso, quer os críticos queiram quer não, ele continuará sendo referência para o estudo de questões humanas profundas e fonte de inúmeros ensinamentos e inspirações, não só para buscadores espirituais como também para terapeutas e psicólogos, pois Osho é um mestre do autoconhecimento.

O que não é válido na crítica a Osho

Há pessoas que pegam recortes de alguns fatos, como os citados acima, ou mesmo de algumas passagens descontextualizadas de livros ou o uso que novos mestres fazem dos ensinamentos de Osho para invalidar os seus ensinamentos, ou taxá-los de perigosos. Seguindo esses critérios, podemos condenar também a Jesus.

Tentam pintar Osho como um charlatão, que você cairá num mar de ilusão se o seguir. O ensinamento de Osho é justamente o contrário disso, é o do autoconhecimento, da consciência, da autorresponsabilidade. Não há dogmas ou mandamentos em Osho, somente liberdade. Ele nunca quis criar uma idolatria ou religião em torno de si, e diversas vezes inclusive preveniu seus discípulos a respeito disso.

O maior perigo dos ensinamentos de Osho é para a nossa “velha mente”, apegada a padrões religiosos e culturais que vão contra a nossa própria natureza, tanto ao espírito como ao corpo. A quantidade de insights que Osho pode lhe proporcionar é imensa. Como dissemos em outra parte, sua capacidade de criar “espaços” para que a compreensão surja, para que a intuição e realização de seu verdadeiro ser apareça, é incomparável.

Tomemos por exemplo os ensinamentos de Ramana Maharshi e Nisargadatta Maharaj. A autorrealização deles é mais explícita que a de Osho. E os seus ensinamentos mais diretos. Para falar da verdade, estão entre os mais indicados. Mas para se chegar à insinuação da verdade, partindo de questões emocionais, sexuais, religiosas, relacionais, humanas em geral, acredito, ninguém supera Osho.

Outro perigo dos ensinamentos de Osho é o mesmo de Ramana, de Nisargadatta, do Yoga, do Tao ou mesmo o deste site que você lê. A percepção do que é real e o que é ilusório ou transitório e a consequente perda de interesse no ilusório. Mas Osho aponta, mais do que os outros, na direção da conversão disso numa vida mais autêntica, plena e extática, no reconhecimento que a mente é nosso instrumento e o mundo o nosso parque de diversões.

A psicologia prática de Osho é incomparável, muito porque ele tinha a percepção daquela camada além da Psicologia, a camada do ser, da consciência real – sua psicologia era transpessoal. E a espiritualidade de Osho é incomparável porque ele considera e discursa sobre a nossa dimensão humana e mundana, que é aonde estamos.

Sua presença de espírito está também entre as mais altas. Se você o fizesse uma pergunta a respeito de seu relacionamento, por exemplo, ele provavelmente começaria abordando aspectos de sua psicologia que você não suspeitava fossem importantes para a questão. Não raro ele respondia a perguntas indiretamente; parecia sempre estar consciente de muitas dimensões da questão apresentada.

Se eu gostaria de estar em 1984 trabalhando 12 horas por dia em seu ashram no Oregon a troco de alguns momentos com ele? Não, não gostaria. Se os livros de Osho estão entre os que há de melhor companhia para o buscador espiritual em 1984 ou 2024? Sim, estão.

Agora, ter Osho como mestre ou mesmo considerá-lo um é uma questão de gosto, portanto individual. Não se faz obrigatório para nenhum buscador de si mesmo conhecer os ensinamentos de Osho, nem os de nenhum outro preceptor específico. Há mestres suficientes para todos os gostos.

Fonte:https://chela.com.br/mestres/osho/o-lado-b-de-osho/

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